Dos Pés à Cabeça / De norte a sul / De ponta a ponta / do início ao fim



Nascer no Fim do Mundo (I)


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Quando eu abri os olhos, vi as mãos que iam e vinham, me espancando... Custei alguns segundos pra entender o que estava acontecendo, e me lembrei que aquele sujeito estava me esmurrando desde antes de eu desmaiar... Não sei quanto tempo fiquei desacordado, mas deu pra sacar que ele não se satisfez... Com alguma dificuldade, consegui livrar uma das minhas pernas, que estavam sob seus joelhos...

Lutando contra a dor, concentrei toda a minha força num chute em seus testículos... Sentiria a dor por ele, se não tivesse já tanta pra mim... Quando ele se desequilibrou, lhe dei mais dois pontapés no rosto... Mas não consegui me manter em pé, porque a outra perna estava dormente...

Caí de novo... Ele também...

Babi gritava desesperadamente, assim que viu que eu o havia derrubado, veio me ajudar a andar... Enquanto eu fui massacrado, ela gritava por ajuda, e todos apenas olhavam, com excessão dos que fizeram questão de vibrar pelo evento...

Pelo sangue que manchava o braço dela, meu rosto deveria estar ferido... Pela dor que eu sentia, eu não tinha mais um rosto...

Ela me levou para o banheiro feminino... Eu só conseguia enxergar com o olho esquerdo, que me bastou pra constatar que eu estava totalmente desfigurado...

Babi ainda soluçava, chorava em convulsões, mas já não pedia ajuda de ninguém... Eu fiz de tudo pra não gemer enquanto ela lavava meu rosto, na intenção de não deixá-la ainda mais angustiada... Ainda assim, berrei bastante...

Os seguranças da boate vieram... Disseram que eu não poderia estar ali... Ela guardou o choro pra pedir que deixassem ao menos ela terminar de limpar minhas feridas... Não deixaram...

Os amigos dela haviam sumidos, ou estavam em algum lugar que eu só poderia ver com o olho direito... Nenhum deles veio saber como eu estava, ou como ela estava... Acho que todos sumiram quando o cara pulou em cima de mim...

Eu não sabia se falava alguma coisa... Imaginava que ela estivesse se culpando, depois de eu ter dito tanto que não queria estar ali... Mas ela bateu pé: queria ir e não queria ir sem mim...

Fui...

Agora estávamos voltando...

No ponto de taxi, disse pra ela "pega a minha carteira no meu bolso, mas não aperta muito a minha bunda que o corpo todo dói"... Ela sorriu, ainda assim, meio sem graça... Disse que tinha grana pra pagar a viagem na bolsa dela... Eu me soltei dela e me escorei num poste... Ela pegou a bolsa e tirou de dentro a carteira... Fez sinal pra um taxi, que parou... Entrou atrás, comigo...

O taxista pareceu não se sentir muito a vontade com um monstro de filme de terror em seu carro... Mas se sentiu muito à vontade em olhar pras coxas da Babi... Eu não falei nada porque já estava cansado de brigas... Ela não estava...

Tivemos que descer do taxi no meio da viagem, e o cara fez questão de nos deixar num lugar deserto... Parou o carro e disse que não andaria mais meio milímetro conosco... Disse estar ofendido com as coisas que Babí lhe dissera... Falou algo sobre um senhor na idade dele ser desrespeitado dentro de seu próprio veículo de trabalho... Falou algo sobre ser casado, evangélico e não admitir que duvidassem de sua integridade...

Se ele não teve coragem de admirir que estava tarando as coxas dela, o fato de ele ser casado e evangélico não me representa nadaa... Matrimônio e religião não fazem de um mentiroso uma pessoa decente...

Ou será que na igreja dele o pastor diz pros taxistas dirigirem olhando para o banco de trás?

Ela ligou pro celular do irmão, contou o que aconteceu, aonde estávamos e pediu para ele nos buscar de carro... Pela voz que ouvi, meio distante, ele não estava muito satisfeito...

Sentamos no meio-fio, ela pôs minha cabeça em seu ombro e ficou me fazendo carinho... Pediu desculpas e, quando eu disse que a culpa não era dela, disse que eu tinha que ser menos bondoso com ela, que eu sabia como ela era culpada no que aconteceu e que ela pisou na bola até quando beteu boca com o taxista... Aí eu disse que ela só falou pro tiozão o que eu não consegui dizer por falta de alguns dentes na boca... E ela riu...

Falei que se eu não tivesse com a fuça tão nojenta, pediria a ela um beijo... Ela falou que eu nunca conseguiria estar nojento, mesmo que tentasse... E me deu o beijo... Apesar de todos os músculos de meu rosto doerem, foi delicioso...

Depois ela começou a chorar e eu chorei também... Quando o irmão dela chegou, nos encontrou querendo esconder as lágrimas... Babi abriu a porta de trás... Entramos...

Minha cabeça doía, e eu pedi pra que ele me levasse a algum hospital... Babi entrou comigo e ele ficou lá fora, esperando...

No hospital, eu entrei em coma... E assim fiquei por sete anos...


2 Responses to “Nascer no Fim do Mundo (I)”

  1. Anonymous Anônimo 

    Lindo, e trágico!
    Perfeito!

  2. Anonymous Anônimo 

    Lindo e Trágico"
    Perfeito!

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