Dos Pés à Cabeça / De norte a sul / De ponta a ponta / do início ao fim



Textamento Duro

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Eu já não tenho mais o mesmo pique que tinha em minha juventude, onde tudo era poesia, e das boas. Hoje vivo da textualidade dura dos artigos cientîficos, com dados estatísticos, silogismos, normas técnicas, códigos de ética. Hoje não há mais verso nem prosa, meu tempo já passou. Hoje eu não ouço mais música pelo prazer que a música me causa, só por status. O meu Jazz, a minha bossa e a minha experimentalidade são estampados, porque eu ouço boa música, mas o meu gozar por estas audições é duramente apolíneo. Ser culto é muito duro.

Eu, quando jovem, não tive medo de que a ciência e a intelectualidade corressem em minhas veias. Aliás, isso era ser bom para mim. Mas agora eu sou velho e sou culto, o que é a concretização de uma grande maldição e de um grande pesadelo. Eu não deslizo mais por sobre as macias e patináveis superfícies da ludicidade e do lirismo descompromissado. Eu me arrasto, protegido pelas botas do saber, por sobre o áspero e infértil solo da experimentação pragmata. Não experimento pelo prazer do novo, como outrora fizera, mas sim pela obrigação do útil.

Hoje Deus é uma necessidade e ao mesmo tempo uma vítima do homicídio a que eu sirvo. Minha fé é uma fé interessada. Se Deus não existir, tudo o que eu faço perde sentido, é consertar uma máquina que não produz nada, que só gasta combustivel. Mas se Ele há, então ha uma razão para que minha ciência continue a fazer as engrenagens do mundo funcionarem. Então vou continuar a crer em Deus, e usar os meus resquícios de alma (e) de filosofia para manter Deus vivo. Mesmo que seja tão vivo quanto Quincas Berro d'Água depois de sua primeira morte, eu preciso manter Deus vivo.

Eu poderia ser Deus pra que tudo o que eu faço tivesse razão de ser, mas isso seria viver mais ainda no temor da eminência da morte, quando faleceria também toda a razão do meu ter estado vivo. A ciência ja é a minha primeira morte.

Mas tanto Deus quanto eu, depois de nossas primeiras mortes, não podemos ser como Quincas. Ele acordou pra ir pra onde queria ir, pra invalidar a primeira morte, pra dizer que só morreria como quis e como disse que iria. A segunda morte veio pra anular a primeira, pra fazer dela piada, tendo ela mesmo, a primeira, aspecto de uma. Muitos vieram a não crer na segunda morte, mas só ela valeu, por ter sido a morte vinda da vontade de quem viveu a vida em que ela, a segunda morte, se fez. Já, eu, morto pela ciência que é hoje minha vida, tenho nela, na ciência dura, minha vida pós-primeira morte. Então essa segunda vida (que em QUincas foi mais do que apenas uma segunda vida, foi tão vida quanto a primeira), em mim, não passa de um prolongamento da minha primeira morte. Minha primeira morte e minha segunda vida, se chamam ciência. Uma ciência que depende de divindade para ter sentido, tendo eu ou sendo eu Deus.

Diante da ciência (minha primeira morte e segunda vida), a vindoura segunda morte (esta, tida pelo mundo como a verdadeira, tanto quanto a primeira de Quincas) seria não uma afirmação de toda a minha vida e uma negação da primeira morte, mas sim uma negação de tudo: da primeira morte; da segunda vida; e até da primeira vida, já contaminada pela ciência, já que eu e o mundo cremos que eu sou (e não estou) cientista. A segunda morte de quincas é poesia matando ciência. A minha segunda morte será ciência se suicidando.

E o Deus que eu tento manter vivo? Como será sua segunda morte? Sinceramente, não será. Porque para ele chance alguma de segunda vida há. O que eu tenho para mante-lo vivo é apenas a filosofia pouca que me resta. Mas ela já não é mais filosofia, porque a minha ciência, nascida dessa filosofia, a negou até que ela morresse, de uma negação homicídio. Se há filosofia ainda, não há chance nenhuma de minha ciência tê-la como acessível. Então a segunda morte de meu Deus é, na verdade a mesma segunda morte da minha ciência. é o mesmo suicídio, previsível, inevitável, tão mecanicista como minha maneira de entender o real.

Eu que, por tanto ter tentado, sem sucesso, entender deterministicamente a alma, acabei por ignorá-la e deter-me apenas no sucesso de poder traduzir o corpo e reduzir tudo a corpo e em corpo, agora pago por isso. E o preço é ser um corpo sem alma. Sem poesia, sou uma ciência defunta, morta-viva, esperando a hora de cair. Sou um zumbi culto, apreciando um quadro que vale fortuna, na minha parede. Parede tão dura quanto a escrita de meus artigos.

Só que bem menos áspera.


A TALE OF NO ONE LOVE

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Ela veio falar comigo, mas eu não sabia o que dizer. Eu até sabia, mas me enrolava todinho. Eu pensei que ela fosse embora, atrás de outro cara, mais sagaz com esses lances de paquera, sei lá, mas ela ficou. Eu só sabia falar de uma coisa, ela atropelava com uns assuntos diferentes, eu tinha certeza absoluta de que aquilo nunca daria certo.

Na verdade, tinha nada pra dar certo não. A gente tinha acabado de se conhecer, era só uma guria papeando com um cara em uma festa. Mas eu não vou mentir que, na minha cabeça, eu não estava fantasiando centenas de possibilidades, de chances.

Ela não era das pessoas mais normais não. Gesticulava bastante, tinha um pouco de álcool no sangue, acho que não era acostumada a beber não. Mas o papo dela tentava convencer de que ela tinha uma rotina de farras assim. Eu tinha dado só umas goladas em um vinho ruim pra porra, estava mais do que lúcido.

Eu achava que ela estava dando mole pra mim, mas na minha cabeça, uma vozinha dizia "larga de se achar, ela só tá papeando contigo, que motivo ela teria pra se interessar por ti". I ever heard this voice, e a história se repete: ela vai cansar de mim e vai arranjar outro cara. Eu vou continuar esperando um amor eterno, uma princesa encantada, uma história imaculada. Eu sou estúpido assim desde novinho.

Eu só falava de Villa Lobos, de Morte e Vida Severina, da Cássia Eller. Ela fingia estar interessada, ou estava, sei lá, mas falava uns trecos que não tinham nada a ver. Eu fingia estar interessado, ou estava, sei lá. É que é difícil estar à vontade em um papo em que você acha que a outra pessoa tá falando de outra coisa, pensando que é daquilo que você tá falando. Mas ela gostava da Cássia, comentava bastante, apesar de ter dito umas coisas que não condiziam, esses papos de biografia mesmo. Mas foda-se isso, né?

Daí a gente descobriu um gosto comum, pintura. Ela era ligada nesses caras da Escola de Paris, os impressionistas. Ficamos um bom tempo papeando. Ela me disse que pinta, eu falei "que bacana", e ela "Cê acha", daí eu falei que sim. Aí ela falou "Cê tem uma boca bonita", e eu mudei de cor. Aí ela pegou e me deu um beijo. Aí o resto da noite foi mais igual ainda a todas as outras histórias de festa.

Depois disso a gente se viu umas vezes, de dizer oi. Mas ela não era minha princesa encantada não. Eu acho.


VINCENT WILLEM, FRIEDRICH WILHELM AND ME!

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É que eu tenho medo de me matar, feito Van Gogh, meu herói de infância, ou morrer de Louco, feito Nietzsche, meu novíssimo herói. Eu fui redescobrir a biografia de Van Gogh, agora, pra descobrir que ele tem muito a ver com o alemão, que eu já vinha descobrindo, e que a biografia dos dois me causa o mesmo efeito. A de Nietzsche, agora, do mesmo jeito que a de Van Gogh há uma década, se não mais. E eu, aos oito, nove anos, conhecia menos do mundo, mas era mais desbravador por não achar que conhecia tanto. Crescer pode ter me dado a base pra ver Nietzsche e rever Van Gogh de forma mais sensata, ou pode me ter fechado os olhos, para vê-los de modo arrogante. A obra de ambos me encanta e, apesar de hoje (digo, na contemporaneidade), Van Gogh ser muito mais unânime (como se unanimidade permitisse gradação) do que Nietzsche, a este nível de obra mesmo, eu acho que ambos são mal compreendidos. Ambos foram ignorados pelo mundo, por seus respectivos mundos, em vida, e hoje são adorados, quase unânimes, mas me parece, na minha humilde e tola opinião, que as pessoas ovacionam muito mais do que o que partilham na leitura das obras de ambos. É sinal de cultura, de bom gosto, de refinamento olhar pra uma reprodução de Van Gogh na parede e dizer "Que lindo, é Van Gogh!", mesmo que seja apenas um sentimento de beleza construído sobre o pre-conhecimento daquela mistureba de cores, que se fossem desconhecidas, não passariam, para aquele sujeito, de uma mistureba de cores, mesmo. E os olhinhos brilham de verdade, o brilho nos olhos não é fingimento.

E aí eu ouço todos falarem de Nietzsche, um cara que eu nunca li, mas de quem todo mundo fala. Quem é esse cara? Pelo que falam, é odioso, odiável! Uma figura típica do academismo prepotente que nos tem sido câncer social. Alguém que eu até imaginava que nem merecia a minha leitura, nem mesmo a minha tosca e efêmera leitura. Mas volta e meia eu ouvia dele, coisas que pareciam construtivas, sagazes ou pelo menos instigantes. E isso me interessou! Existem dois Nietzsches? Eu fui ler pra descobrir que não! Existe um Nietzsche, e algo que é chamado de Nietzsche por aqueles que acham mais importante decorar suas frases e a soletração de seu nome do que dar a devida seriedade ao que ele nos deixou. Eu descobri o quão linda era a obra de Nietzsche e, empolgado como só eu, não conseguia dividir a minha empolgação com quase ninguém. Todos o amavam com o amor dos soletradores (que eu não conseguia captar como válido e só podia cometar com ironia, na tentativa de não ser hostil), ou o odiavam com o ódio que eu tinha, o dos que poucoligam se é Nietzsche ou Níte.
Vincent Willem, Friedrich Wilhelm and me!


Dia desses bateu saudades de Van Gogh, da época em que eu respirava cores, achava que um dia pintaria o mundo, dessas coisas de infância, o lado bom dela. E lendo história de vida, de obra, as cartas, os boatos acerca, fui sentindo o que eu não lembrava que sentia, a identificação. Só que com uma sensação nova, uma de "Céus! Foi assim com o Nietzsche também!". Foi com o Van Gogh que eu descobri que me identifiquei com a personagem Friedrich Wilhelm Nietzsche, porque relembrei o que eu senti quando conheci a personagem Vincent Willem Van Gogh e percebi que tinha sentido isso recentemente, em outra descoberta, a descoberta da arte Nietzschiana, que eu ouso chamar de arte porque a vejo assim. E fiquei remoendo essa informação, essa sensação, até que a ficha me caiu.

Como Nietzsche e Van Gogh, entre outros, hoje adorados, hoje reconhecidos como geniais, não foram devidamente agraciados pelas honras de seus trabalhos? Ficaram pra história? Sim! E isso é lindo, mas o reconhecimento que eles mereciam (E SIM! Eles mereciam!), não tiveram. Isso é angustiante, eu vejo tantos bons artistas, pensadores, gênios, entregues ao ostracismo, tantas celebridades descartáveis ganhando o brilho dos holofotes. Será que não tem algo errado aí? E não é só de reconhecimento do grande público, suas vidas pessoais, a nível de amizade e amor, foram conturbadíssimas, sem a felicidade de fim de conto infantil com que todos sonhamos. E eu não acho isso justo. Acho assustador. Eu quero ser tão genial como os dois, quero por vaidade, no sentido de ter o sucesso como objetivo. Na verdade o sucesso não me é objetivo, mas quando eu penso no assunto, no reconhecimento, eu acho SIM que eu deva querê-lo, e eu não quero morrer apagado, só pra ficar na história um dia, quem sabe. Eu não quero uma vida cheia de chagas, vazia de afetos, ou cheia de afetos chagais (me permito a invenção da palavra, se ela ainda não há), e temo que este seja o meu destino.

O que penso é, se o destino é algo que a gente trilha ou se independe de nossos atos, de nossa vontade, veio pronto pra gente, como um suéter que se vista no frio, que aperte nos pulsos, na cintura e no pescoço. Será que Nietzsche e Van Gogh viveram pra ser o que foram, pra sofrer o que sofreram, ou será que tinha que ser assim e simplesmente foi? Será que eles tiveram de viver as chagas como conseqüência de suas genialidades ou âmbas as coisas, chagas e frutos, são mera construção do acaso (ou de um destino muito bem tramado e nem um pouco dado a acasos?)

Eu penso que não há causa, não há conseqüência, mas também não há destino. Há o injusto fim envolto por chagas, que lamentávelmente ambos tiveram e que eu temo, que eu não quero ter, e há a beleza das mensagens destes dois artistas, pensadores, há as obras apaixonantes destas duas personagens apaixonantes, que me encantam e me inspiram vontade de continuar.

Salve Van Gogh, Salve Nietzsche, Salvem-me!


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Ela não tinha mais mãos, pois todas elas estavam ao redor do corpo dele, nos lugares mais variados, e nunca nos mesmos...

Ele não tinha mais palavras para fazer declarações pois já tinha dito tudo o que poderia, através de palavras, dizer para dizer o que sentia... Agora usava a língua para demonstrar seus sentimentos de outras maneiras...

Ela não conseguia fazer silêncio, mesmo que os gemidos se tornassem sussurros e os sussurros se tornassem nada, ainda se ouviria o bater desesperado de seu coração...

Ele acordou...


Mangue & Restinga

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Aqui estárá o livro de poemas que eu venho escrevendo e que está quase concluído:

http://manguerestinga.blogspot.com/

Enjoy ou Enjoe...


Nascer no Fim do Mundo (I)

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Quando eu abri os olhos, vi as mãos que iam e vinham, me espancando... Custei alguns segundos pra entender o que estava acontecendo, e me lembrei que aquele sujeito estava me esmurrando desde antes de eu desmaiar... Não sei quanto tempo fiquei desacordado, mas deu pra sacar que ele não se satisfez... Com alguma dificuldade, consegui livrar uma das minhas pernas, que estavam sob seus joelhos...

Lutando contra a dor, concentrei toda a minha força num chute em seus testículos... Sentiria a dor por ele, se não tivesse já tanta pra mim... Quando ele se desequilibrou, lhe dei mais dois pontapés no rosto... Mas não consegui me manter em pé, porque a outra perna estava dormente...

Caí de novo... Ele também...

Babi gritava desesperadamente, assim que viu que eu o havia derrubado, veio me ajudar a andar... Enquanto eu fui massacrado, ela gritava por ajuda, e todos apenas olhavam, com excessão dos que fizeram questão de vibrar pelo evento...

Pelo sangue que manchava o braço dela, meu rosto deveria estar ferido... Pela dor que eu sentia, eu não tinha mais um rosto...

Ela me levou para o banheiro feminino... Eu só conseguia enxergar com o olho esquerdo, que me bastou pra constatar que eu estava totalmente desfigurado...

Babi ainda soluçava, chorava em convulsões, mas já não pedia ajuda de ninguém... Eu fiz de tudo pra não gemer enquanto ela lavava meu rosto, na intenção de não deixá-la ainda mais angustiada... Ainda assim, berrei bastante...

Os seguranças da boate vieram... Disseram que eu não poderia estar ali... Ela guardou o choro pra pedir que deixassem ao menos ela terminar de limpar minhas feridas... Não deixaram...

Os amigos dela haviam sumidos, ou estavam em algum lugar que eu só poderia ver com o olho direito... Nenhum deles veio saber como eu estava, ou como ela estava... Acho que todos sumiram quando o cara pulou em cima de mim...

Eu não sabia se falava alguma coisa... Imaginava que ela estivesse se culpando, depois de eu ter dito tanto que não queria estar ali... Mas ela bateu pé: queria ir e não queria ir sem mim...

Fui...

Agora estávamos voltando...

No ponto de taxi, disse pra ela "pega a minha carteira no meu bolso, mas não aperta muito a minha bunda que o corpo todo dói"... Ela sorriu, ainda assim, meio sem graça... Disse que tinha grana pra pagar a viagem na bolsa dela... Eu me soltei dela e me escorei num poste... Ela pegou a bolsa e tirou de dentro a carteira... Fez sinal pra um taxi, que parou... Entrou atrás, comigo...

O taxista pareceu não se sentir muito a vontade com um monstro de filme de terror em seu carro... Mas se sentiu muito à vontade em olhar pras coxas da Babi... Eu não falei nada porque já estava cansado de brigas... Ela não estava...

Tivemos que descer do taxi no meio da viagem, e o cara fez questão de nos deixar num lugar deserto... Parou o carro e disse que não andaria mais meio milímetro conosco... Disse estar ofendido com as coisas que Babí lhe dissera... Falou algo sobre um senhor na idade dele ser desrespeitado dentro de seu próprio veículo de trabalho... Falou algo sobre ser casado, evangélico e não admitir que duvidassem de sua integridade...

Se ele não teve coragem de admirir que estava tarando as coxas dela, o fato de ele ser casado e evangélico não me representa nadaa... Matrimônio e religião não fazem de um mentiroso uma pessoa decente...

Ou será que na igreja dele o pastor diz pros taxistas dirigirem olhando para o banco de trás?

Ela ligou pro celular do irmão, contou o que aconteceu, aonde estávamos e pediu para ele nos buscar de carro... Pela voz que ouvi, meio distante, ele não estava muito satisfeito...

Sentamos no meio-fio, ela pôs minha cabeça em seu ombro e ficou me fazendo carinho... Pediu desculpas e, quando eu disse que a culpa não era dela, disse que eu tinha que ser menos bondoso com ela, que eu sabia como ela era culpada no que aconteceu e que ela pisou na bola até quando beteu boca com o taxista... Aí eu disse que ela só falou pro tiozão o que eu não consegui dizer por falta de alguns dentes na boca... E ela riu...

Falei que se eu não tivesse com a fuça tão nojenta, pediria a ela um beijo... Ela falou que eu nunca conseguiria estar nojento, mesmo que tentasse... E me deu o beijo... Apesar de todos os músculos de meu rosto doerem, foi delicioso...

Depois ela começou a chorar e eu chorei também... Quando o irmão dela chegou, nos encontrou querendo esconder as lágrimas... Babi abriu a porta de trás... Entramos...

Minha cabeça doía, e eu pedi pra que ele me levasse a algum hospital... Babi entrou comigo e ele ficou lá fora, esperando...

No hospital, eu entrei em coma... E assim fiquei por sete anos...


Qual é a música? Posso saber? (parte 2 e final)

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Parte 1

Eu acho que não bato bem da bola... Ficou ele, com aquela cara de "Não, eu não mijei nas calças! Foi a doida da Ana Claudia que derramou a cerveja em mim!", olhando para a minha cara de "Se você me chamar de burra de novo eu te capo cum uma dentada"... Todo mundo olhando...


Ai ele levantou e olhou pra mim, alterado... Falou num tom de voz baixo, mas que todo mundo no recinto conseguiu entender com clareza: "Desisto de tentar te entender"... E foi andando pro banheiro masculino... Aí todo mundo tava ou olhando pra ele ou pra mim... O Jão tava olhando pra mim... Com uma cara de "Você deveria estar olhando pra ele e não pra mim, Clau"...

Aí eu não sei se eu fiz o que eu lembro que fiz, mas eu me lembro que corri, segurei no ombro dele e ele olhou pra tras... Aí eu puxei ele pra perto de mim, sussurrei "você é a coisa que mais me importa nesse mundo agora", dum jeito que só o anjo da guarda dele, ele e eu ouvimos... Aí me grudei nele e fiquei na ponta dos dedos pra dar um beijo dele... Ele amoleceu todinho, como se fosse um gatinho vendo leite depois de três dias de jejum... Aí veio com a sede toda e me beijou antes que eu o beijasse, aí eu amoleci junto com ele... Aí ou ele me levantou ou eu flutuei, porque nem as pontas de meus pés estavam tocando o chão mais...

Eu senti as mãos e os braços deles em minhas costas... Depois senti as costas dele em meus braços e minhas mãos... Uma coisa de cada vez, porque se sentisse isso tudo ao mesmo tempo e junto com a boca dele na minha, acho que explodiria ali, grudada nele... Aí senti um cheiro de flor de maracujá... E percebi que ele tava sentindo, pelo peito dele grudado no meu, o desespero com que o meu coração batia... Tudo muito técnico... Já que vou explodir, o meu coração tem que bater nos meus próximos 17 segundos o que teria de bater nos meus próximos 62 anos de vida... Simples desse jeito...

Aí ele nos separou , de súbito... Segurando firme na minha cabeça... Olhou nos meus olhos, deve ter visto a minha alma ali... Eu vi o paraíso... Aí disse "Não vale a pena tentar te entender mesmo, né?"...

"Pra quê?" respondi... "Desessete segundos de paz me fizeram não fazer mais questão de achar respostas"...

Aí ele riu e disse "Já desisti", e me beijou de novo... Gato em jejum quaresmal mergulhando num pacífico de leite... Guitarra de Petrochi... Quando eu acordei do transe o restaurante reapareceu ao nosso redor e nós dois estávamos sem fôlego...

Silêncio profundo no ambiente...Minha cabeça apoianda em seu peito... Mais disparado que o meu, o dele... "Não vai secar a calça?" , "Não, eu só ia ao banheiro pra chorar escondido...", "Promete pra mim que vai me encher de porrada na primeira oportunidade que tiver?", "Promete pra mim que nunca mais me acerta nada de vidro na testa?", "Só se vc prometer nunca falar mal do Rimbaud"...

Eu adoro Rimbaud, disse ele...

Aí me deu uma sensação estranha, de que tudo estava errado... Mas como eu não sabia que grau de "tudo", saí dos braços dele e o empurrei... Quando me virei pra mesa, vazia...

Até o Jão tinha se levantado... Ele fez uma cara de que também não tinha notado que tinhamos sido abandonados ali, mas eu achei que tinha muita coisa errada pra eu me dar o luxo de sonhar que teria direito de crer em algo dali pra frente...

Ele tentou me abraçar de novo, na intenção de me consolar do susto ou de se consolar pela situação... Aí eu não soube o que fazer e fiz a primeira coisa que me veio à cabeça... O empurrei e gritei "Rimbaud não é turco!"...

- Calmaê - Fez uma cara de quem acabou de entender a trama do livro que tá lendo há três semanas - Foi você quem me mandou aqueles poemas todos?!?

Disse que sim... Eu já tinha dito pra ele que sim, oras...

- Poxa! Tem um mal entendido aí... As cartas que eu falei são outra coisa...

Me soou a mentira mais descarada do mundo... Aí ele chamou o garçon, e tateou o bolso atrás de algo, até descobrir que o único bilhete inteiro tinha sumido...

Pediu a conta... Pagou a dele, eu, a minha... Fiquei emburrada... Ele tentou falar comigo e eu não dei confiança...

Minha bolsa estava em cima da mesa... Fui pegar o dinheiro, ela estava meio mal fechada, com um papel atrapalhando...

Era um bilhete... Do Jão...

"Clau, melhor deixar vocês conversarem...

Eu falei pra tua irmã que o Mark ia poder vir hoje, e que ele passaria na tua casa pra te buscar...

Pena que você não recebeu o recado, porque ele foi e deu viagem perdida...

Beijos, João Pedro..."

Aí eu olhei pra cara do Marcos... Aí me deu raiva do mundo... Quis sair correndo, mas antes disso, fui pagar a conta...

Ficamos os dois parados... Ele do meu lado, querendo não demonstrar que queria me abraçar, mas com medo de tertar e rolar outro escândalo... Eu, do lado, com a cara emburrada, fingindo que não queria abraçá-lo, mas preparada pra empurrá-lo assim que ele me abraçasse... Como eu notei que não ia resistir e ia tentar abraçar ele antes dele tentar me abraçar, decidi mexer na bolsa... achei o celular lá e pensei em ligar pra Bia, mas liguei pra Amanda, que foi um pretexto menos na cara...

Ana Claudia? Bia, o que o Jão falou contigo? Porque? Bia, O QUE O JÃO falou contigo...

Meu fofo ficou antenado, como cão preso no quntal, quando percebe que tem outro cachorro apontando lá na outra esquina...

Ele falou da pizzaria... Aquilo que eu te... BIA! ELE FALOU SOBRE O MARCOS? - aí ela não falou nada e eu ci que ele tinha avisado pra ela mesmo - PORQUE VOCÊ NÃO FALOU NADA, SUA VACA?

- Calma, Ana, calma, ele disse...

Eu falei baixinho, com minha irmã:

Amanda, você... Desculpa, Aninha, eu tinha esquecido... De verdade... Avisa pra Mãe que eu não durmo em casa!

E desliguei... Eu não ia dormir fora de casa... Mas ela ia pensar que eu ia dormir com alguém e ia se doer pelo cuzão do amigo dela... Deve ter feito isso tudo por ele...

Deu ódio... E eu não sei se era dela, dele (qualquer um os "eles" envolvidos na história), de mim ou do Hermeto... E não sabia qual seria a solução agora agora... Ou eu fugiria correndo assim que o garçon pegasse a grana, ou eu o jogaria na mesa e o espancaria com o frasco de azeite que ainda restava na nossa mesa ou eu me jogaria em seus braços e transaria com ele ali mesmo, em cima do frasco de azeite e do pote com sal... A primeira opção certamente era a melhor saída... A Melhor saída para a minha pior noite...

Tava preparada pra correr, mas a gente saiu andando junto... Eu nunca escolho a melhor saída...

Fiquei rezando pra ele fingir que eu não estava ali e irmos logo pra longe um do outro... Aí ele chamou o meu nome...

"Que foi, porra?", eu perguntei... Aí ele pediu pra olhar pra ele... Eu queria olhar, mas não queria... Aí, ainda antes de olhar, fiz uma cara de raiva e olhei pra ele já com a cara de raiva... Disse "Pronto, olhei"... Aí ele perguntou porque eu beijei ele, se eu não tinha acreditado no que ele tinha dito...

Eu fiquei meio sem jeito... Mas minha cabeça funcionou rápido, eu lembrei que eu ia beijá-lo, mas ele acabou me beijando antes... Aí eu falei que ele é que tinha me beijado, dando ênfase ao "VOCÊ"...

Aí ele perguntou porque eu deixei ele me beijar... Aí eu perguntei se ele queria que eu batesse nele... Aí pensei "PORRA, não tinha nada mais idiota pra mresponder não?"... Acho que ele pensou a mesma coisa... Que fez uma cara de quem chupa maracujá e mastiga a semente... e disse que não tinha sido a força... é... não tinha sido à força...

Depois ele falou da garrafa mais uma vez... Aì eu disse que a garrafada foi outra coisa, mas nem eu sabia mais... Eu ainda precisava de umas duas horas pra assimilar tudo o que aconteceu ali...

Minha pior noite...

Aí ele jogou na minha cara que ainda estava sangrando... E nem estava sangrando porra nenhuma... tinha parado há horas... Aí eu mandei ele pra merda e disse que não tava nem aí pra testa dele... Mas eu tava sim...

Aí ele insistiu no motivo do beijo... Acho que ele e eu sabíamos que se ele não me beijasse, eu o beijaria... Mas eu insisti em querer crer que foi ele quem me beijou e que eu era uma donzela indefesa e enganada... Falei pra ele que ele é que deveria saber o motivo...

E ele disse que o motivo dele foi ter visto que eu tava afim... aí falou algo como "Se não queria, porque deixou? Se queria, porque tá assim agora?"

Aí eu lembrei das coisas que ele me disse e disse pra ele que fiquei chateada... Mas além de ele não saber de tudo o que tinha passado por minha cabeça, ele tinha dado uma desculpa pro lance das cartas... Se bem que eu não tinha entendido lhufas...

Aí ele escolheu a pior ordem pra dizer as coisas que disse depois...

Primeiro, disse que gostava de mim... Aí eu fiquei, por alguns segundos, nas nuvens... Por alguns segundos... Depois ele jogou na minha cara que eu tinha quebrado a porra da garrafa naquela porra daquela testa linda dele... Me senti uma babaca descontrolada, descontando minha TPM num pobre rapaz inocente... Depois disso, ele disse que tava mendigando uma resposta minha... Aí deu ainda mais dó dele... aí fez aquela carinha de cachorro sem dono, fofinha... Só por frações de segundos... Porque depois ele fez aquela cara de "Vá pra casa do Caralho", e falou "Quer saber? Foda-se!"...

Aí virou as costas e saiu...

Aí eu respirei fundo e senti o ar entrando em meus pulmões... Parecia o movimento dele com o bater das asas de um cupido...

Aí lembrei da Bia e do Jão... Eu não era o cupido dos dois... Eles é que eram os meus cupidos...

Aí lembrei do Jão, olhando pra mim: "Você deveria estar olhando pra ele e não pra mim, Clau"...


Aí fui... Fui depressa até tocar o ombro dele... Aí lembrei da Bia e quase ri, mas acabei chamando o nome dele... Ele se virou... Perguntou o que eu queria...

Aí... Aí eu perguntei "Eu dou na primeira noite?", e o abraçei...

Ele não entendeu, mas eu, ávida por saciar minha sede, corri na frente, antes que ele entendesse, antes que ele pensasse, antes que ele tentasse... Beijei-o desesperadamente... Beijei na intenção de ele não ter tempo de me beijar antes... Não dessa vez...

Só beijei... Sem pensar em dar respostas...

Mas tinha feito uma pergunta... E ele parou, segurando a minha cabeça, olhou em meus olhos, a gente riu junto... Rimos um pro outro... E ele:

"Quem disse que é a primeira noite?" Esperava por isso já há quase vinte meses... Depois disso, juro que já não sei mais quem foi que beijou...

Pegamos um Taxi, fomos pra casa dele... escrevi uma mensagem pra Beatriz: "tô indo pra casa dele"... Enfiei o aparelho na bolsa... Falei pra ele que tudo seria mais fácil se ele tivesse celular... Aí ele disse que às vezes sentia vontade de ligar pra mim, mas não tinha coragem...

Aí eu falei que quando isso acontecia, eu mandava cartas... E ele falou que mandava flores... Aí eu falei do dia que o Jão, ele e eu ficamos conversando sobre cantadas, conquistas e coisas assim, e que eu tinha dito que achava romântico coisas criativas, novos sabores de bombons e doces, novos lugares pras flores... Nem imaginei que ele lembrasse disso... Nem imaginei que ele tivesse mandado o vaso de flores ou a cesta de chocolates... Aí lembrei do filme que chegou pelos correios, da estátua que apareceu na frente da minha casa certa vez... E do casaco que eu não sabia quem poderia ter mandado...

Será que foi de tanto eu rezar pra meu admirador secreto ser ele? Sei foi ou não... Comecei a rezar pra aquela noite não terminar nunca... Minha melhor noite... Pelo menos poderia durar bastante...

No rádio do taxi tava tocando Zélia Duncan... acho que era CD... E a gente estranhou porque geralmente a melhor coisa que os taxistas daqui ouvem é o Roberto Carlos...

Perguntei pro meu Mercos se era Zélia Duncan, ele disse que achava que sim e perguntou pro taxista pra conversar...

- É sim... Vocês gostam?
- Bastante - Aí pensou por alguns mínimos segundos - Qual é a música? Posso Saber?
- É Sortimento - respondeu o cara...

Achei que tinha haver com a gente... Mais que o Rambô...

Daí foi tudo um grande sonho... Lembro que eu acordei no outro dia... Ele dormindo feito um anjo... Os braços dele pareciam duas muralhas, me protegendo dos perigos de lá de fora... E eu nunca tinha me sentido tão protegida, tão amada, tão feliz... Peguei o celular na minha bolsa... olhei as horas, eram oito e treze, já... Mas acho que ainda era sábado ou domingo, então nem liguei...

Fui pro banheiro e liguei pra Bia... Contei mais ou menos como tinha sido tudo... Da Amanda à Zélia... Ela falou que se ele acordasse e não me encontrasse lá, ia sentir ainda mais vontade de ficar comigo... E que se eu deixasse um bilhete dizendo que voltava logo, ele ia ficar contando as horas pra esse logo chegar logo... Aí eu me olhei no espelho...

Fui até minha bolsa, peguei a caderneta, arranquei uma folha... Apoiei na capa da agenda e escrevi que voltava logo e que queria que ele esperasse por mim... Bia disse que tinha ficado perfeito... e que era pra eu colocar no criado mudo, na beira da cama dele... Mas eu já sabia bem o que fazer...

Depois de desligar o celular, coloquei-o na bolsa, peguei o batom, barquei um dos cantos do espelhe e ia colar o bilhete... Mas deu vontade de o amassar...

Aí tirei o celular da bolsa... Ele já saberia que eu voltaria se encontrasse o celular ali...

Deixei no criado mudo...

Aí fechei os olhos... Arranquei outra folha da caderneta, apoiei sobre o criado e escrevi a primeira coisa que me veio à cabeça... "Minha melhor noite, Meu melhor homem, minha melhor saída..."

MEU MELHOR HOMEM...

Aí pus embaixo "Volto antes das três..."

Putz! acho que voltava antes de meio dia... Mas deixei assim mesmo... Quanto maior a espera, acho que seria melhor...

Fui lá no banheiro e pressionei sobre o pedaço de batom, com o dedo... Aí vi minha imagem nua no espelho... Acho que tô gorda... O bilhete ficou grudado, aí eu voltei pro quarto pra pegar a minha roupa, me sentindo horrível depois de me ver no espelho... Aí olhei pra cama, e o vi, também completamente nu... E minha auto estima voltou ao auge quando me lembrei que há poucos minutos eu estava em seus braços...

Me vesti, beijei seu rosto e saí... Quando abri a porta do apartamento dele, tive a mesma sensação da noite anterior, quando nós dois chegamos... A sensação de já ter estado ali antes...

Fui pra casa da Bia... Acho que ela tem todos os discos da Zélia Duncan em casa... E eu precisava ouvir uma certa música...



De ontem pra hoje eu dormi com um cara, de quem eu gosto... E acho que descobri que ele também gosta de mim...

Hoje, quando eu cheguei na casa dele, tinha uma guria degolada... Vizinha...

Ontem eu quebrei uma garrafa na cabeça dele... E ele me beijou...

Vou tentar colocar minha cabeça em ordem... Foi bem assim...

Eu e o pessoal da Faculdade estávamos numa pizzaria... Não, restaurante... E...

Não... Antes...

Eu recebi um vaso de flores... Um vaso mesmo... Foram até o meu apartamento com um lindo arranjo de flores dentro de uma privada... A coisa mais escrota do mundo... Foi o que minha irmã disse... Eu achei o máximo...

Mas não tinha bilhete... E eu deduzi logo: Foi o Alfredo... Ele tá dando em cima de mim há dois meses... Acha que eu tô fazendo charme... Mas eu não quero nada mesmo... É que tirando a idéia da privada... Nada nele me atrai... Pelo contrário...

Levei pro meu quarto... Minha mãe falou "Que horror" quando eu passei pelo corredor puxando a cordinha... É que a privada tava em cima de uma estrutura, e tinha umas rodinhas...

Minha irmã me deu um sanduíche de pão de forma... Desses com apresuntado e queijo fatiados... Comi... Ela perguntou se eu sabia quem era... Falei que foi o Alberto... Pensei que ela estivessa falando de quem me deu as flores... Mas ela queria saber de outra coisa... E não entendeu do que eu estava falando...

Aí meu celular tocou... Eu fui atender e tinha caído... Futucando pra ver quem é, descobri que o João tinha ligado... Mas eu não atendi ligação do João hoje de manhã, pensei... João Pedro... É uma gracinha... Pena que seja Gay... Na verdade... Eu gosto mesmo é do melhor amigo dele, que eu acho que não é gay... Ele é tão fofo que é o melhor amigo do João mesmo sabendo que ele é gay...

Nenhum dos meninos que sabem que algum outro menino é gay mantém amizades... Só o meu fofo... Que também é meu amigo, e se ficar sabendo que eu gosto dele, eu morro de tão vermelha... Sei que é adolescente pra caralho... Mas às vezes eu sou assim...

Só que o meu fofo me ignora... Quer dizer... Ele me trata muito bem... Mas trata a todos e TODAS muito bem... Acho que é só por educação... Apesar de estudarmos juntos há um ano e meio, e de convivermos diariamente e sairmos junto com a galera sempre... Bem... Às vezes acho que sou tão melhor amigo dele quanto o João... Mas é pouco, eu quero é beijo de língua...

Aí eu perguntei "Mãe, a senhora que recebeu ligação do Jão?", e minha irmã, do banheiro "FUI EU!"... E minha mãe "Que Jão?", e minha irmã "O Bichinha"... E eu belisquei minha irmã quando ela saia do banheiro: "Olha como fala, Viada!"...

Minha irmã acha que eu sou apaixonada pelo Jão... Aí eu dou corda pra ela continuar achando...

"Desculpa falar assim do pedroca", ela disse, irônica... "Eu te perdôo", respondi, impondo as mãos sobre sua cabeça... Aí ela riu e disse que o "Pedroca" Queria me chamar pra pizzaria...E eu, "Iá... Não era Restaurante?"... "Ah! É!.. Restaurante..."

Aí eu disse que ele já tinha me chamado, e ela fez uma careta, e fechou "Bem, foi isso...", indo pro quarto dela...

Aí eu liguei pro Jão... Não atendeu... Aí eu liguei pra casa do meu fofo, pra ver se o Jão tava lá... E ele não atendeu... E ele não tem celular...

Usei o Jão como desculpa... Só com um motivo que eu crio coragem pra ligar pra ele... Pro meu fofo... É que ele tem uma voz tão bonita... Eu só tenho coragem pra escrever cartas... Anônimas...

Dessa vez foi um Rimbaud:

"Ma Bohème
(Fantasie)

Je m' en allais, les poings dans mes poches crevées;
Mon paletot aussi devenait idéal;
J' allais sous le ciel, Muse! et j' étais ton féal;
Oh! là là! que d' amours splendides j' ai rêvées!

Mon unique culotte avait un large trou.
- Petit-Poucet rêveur, j' égrenais dans ma course
Des rimes. Mon auberge était à la Grande-Ourse.
- Mes étoilles au ciel avaient un doux frou-frou.

Et je les écoutais, assis au bord des routes,
Ces bons soirs de septembre où je sentais des gouttes
De rosée à mon front, comme un vin de vigueur;

Où, rimant au millieu des ombres fantastiques,
Comme des lyres, je tirais des élastiques
De mes souliers blessés, un pied près de mon coeur!"

Peguei da Internet... Não são declarações de amor... Mas acho esse cara a minha cara... Acho que ele é francês, porque os originais são em francês... Mas eu catei a tradução também...

"Minha Boêmia
(Fantasia)

Lá ia eu, de mãos nos bolsos descosidos;
Meu paletó também tornava-se ideal;
Sob o céu, Musa! Eu fui teu súdito leal;
Puxa vida! A sonhar amores destemidos!

O meu único par de calças tinha furos.
- Pequeno Polegar do sonho ao meu redor
Rimas espalho. Albergo-me à Ursa Maior.
- Os meus astros nos céus rangem frêmitos puros.

Sentado, eu os ouvia, à beira do caminho,
Nas noites de setembro, onde senti tal vinho
O orvalho a rorejar-me as fronte em comoção;

Onde, rimando em meio à imensidões fantásticas,
Eu tomava, qual lira, as botinas elásticas
E tangia um dos pés junto ao meu coração!"

Legal, esse tal de Rimbaud... RambÔ, Eu só lembro do nome dele porque é "Rambo" com acento... La na Universidade tem cursinho de francês... Mas eu sou preguiçosa...

Mando em francês porque meu fofo faz o curso... Ele deve ao menos conseguir traduzir...

Aí, sem conseguir falar com o Jão, deixei pra lá... Afinal, minha irmã já tinha me contado... Eu só queria mesmo era motivo pra ligar para a casa de meu fofo...

Mas eu estava triste... Ele não iria ao restaurante... Tinha problemas para resolver, e não me cabia o que era... Nem tive coragem de perguntar... Na verdade eu queria ir com ele até o restaurante... Pedi pra ele me buscar aqui... Ele disse que não daria... Que triste...

Pensei que ele pudesse estar querendo se livrar de mim, mas isso me magoaria profundamente... Vindo dele, ao menos... Ele é a pessoa mais fofa do mundo... E uma atitude dessas não seria nem um pouco fofa...

Aí meu celular toca... Beatriz... Me chama de irmã, porque ela é hippie e acha que somos todos irmãos... A primeira vez que fumei maconha foi com ela... Me falavam que Hippie só faz fumar maconha... Não sei se é verdade ou generalização tola... Mas a Beatriz só sabe fumar maconha e desejar a paz a todos os serezinhos do universo...

Eu acho que a Beatriz é lésbica... Mas acho que ela e o Jão formariam um belo casal... Ele é simpático, um amor de pessoa, e vive reclamando que ninguém no mundo entende as suas teorias... Meu fofo ri muito dele, mas é na brincadeira... Mas pra ser sencero, eu acho que o Jão, no fundo, quer mesmo alguém que tope ficar horas e horas conversando sobre o Bob Dylan... E a Beatriz adora o Bob... Os dois... O Dylan e o Marley...

A Beatriz me chamou pra uma festa dumas amigas dela... Eu falei que não dava, porque marquei com o pessoal da facul... Se ela não tivesse compromisso, eu a chamaria... Meu fofo não vai, mas o João Pedro, sim...

Desisti de ser cupida e decidi de última hora que talvez fosse pra festa dela... Eu sei que só vão estar as amigas delas, que são quase todas lésbicas... As que não são, são como a Beatriz... Que eu não tenho certeza...

Eu já beijei uma colega da Beatriz... Num dia que elas duas e mais uma outra menina dormiram aqui em casa... Eu era novinha, e estudava junto com a Bia... No outro dia a menina deixou um monte de bilhetinhos no espelho de meu guarda roupa!..

Foi a coisa mais linda que eu já recebi, e eu a beijei mais uma vez...

Mas depois disso nunca mais... E se a Bia não for lésbica, ela deve achar que eu sou...

Liguei de volta pra Bia... Falei que talvez fosse, ela falou que era só chegar no lugar que logo liberariam a minha entrada... Uh! Sou VIP!

Aí eu decidi mandar uma mensagem pro gracinha do Jão: "Não sei se eu vou hoje a noite, Clau"... Se eu não aparecer, ele explica...

Nem ia ter graça mesmo, sem o meu fofo lá... Aiai... Mais adolescente, impossível... Saí pra pôr a carta nos correios... No caminho, entrei numa loja de flores... Encontrei a Bia lá, comprando incensos...

"E aê, Irmã?", disse ela... Aí eu respondi que tava caçando umas flores... "Pro teu fofo?", disse ela... Aí eu disse que não, e contei da privada... Aí ela disse que o Alfredo é um escroto... Aí eu falei que gostei... Aí ela disse "É, eu sei... Você é mais escrota que ele...", e a gente riu...

Aí a gente saiu da loja de mãos dadas, e ela foi até a agência dos correios comigo...

"Outra carta pro teu fofo?"... Outro RambÔ, respondi... Ela também gosta de Rimbaud... E sabe um pouco de francês, por causa do pai dela, que trabalhou treze anos na frança...

Comprei um envelope e um selo... Ele mora tão perto de mim e as minhas cartas sempre levam três a cinco dias para chegar lá... Chegou mensagem do Jão: "Tua irmã te deu o recado?"... Mandei outra dizendo que sim... Aí a Beatriz foi lá pra casa comigo...

Como a gente sempre anda de mãos dadas, minha irmã deve achar que eu sou lésbica também... Acho que ela acha que o "Pedroca" me curaria dessa "doença"... Irônicamente, acho que ela acha isso...

MInha irmã é a pessoa mais homofóbica da galáxia... Chegou até a me perguntar uma vez, no meio de uma briga, como é que eu conseguia ter tanto amigo bicha e sapatão... Aí eu falei que também sou "Bicha e Sapatão", e ela não entendeu o que eu quis dizer com aquilo...

Agora ela acha que eu sou bicha e sapatão porque eu namoro a Bia e quero catar o Jão... Bem, eu acho que ela acha isso...

Quando ela viu a Bia comigo, gritou: "O Alfredinho te ligou"... Tese minha: Ela acha que a Bia tem ciúmes do Alfredo, e fala dele sempre que a Bia tá aqui só pra "fazer ciúmes" nela... Porque sempre que a Bia tá aqui, minha irmã fala do Alfredo...

A Beatriz nem Tchum... Fomos pro meu quarto e eu tranquei a porta por dentro... MInha irmã vai ouvir o barulho da chave e pensar que a gente vai trepar... Adoro isso...

Deu a louca e eu perguntei "Bia, quer um namorado?"... Ela riu e disse que sim, porque? Aí eu falei que conhecia um guri que se amarrava em Bob Dylan e que curtia incenso tanto quanto ela... Aí ela riu... Aí eu falei que só tinha um probleminha... Um desafio na conquista, porque ele era gay... Aì ela riu mais... Eu pensei "Ela não levou a sério", aí ela disse que adora desafios... Aí fui eu quem não levou a sério...

Aí a gente ficou jogando gamão e fumando maconha... Eu perdi quase todas, como sempre... Depois ela fez umas trancinhas no meu cabelo e a gente saiu... Eu disse que tava em dúvida entre ir ao restaurante ou ir pra festa das amigas dela... Aí ela falou que era melhor eu ior pro restaurante que ia encontrar "meu fofo"... E riu quando disse "meu fofo"... Aí eu falei que ele não ia... Aí ela disse, então vem comigo... Aí eu falei que o Jão iria... E ela disse que era pra eu ir ao restaurante e falar pro Jão que tinha uma amiga minha querendo conhecer ele... "Se for aquele menino da foto mesmo, pode falar que eu quero casar"... A gente ficou rindo horrores...

Eu falei que tinha dito pro Jão que talvez não iria, e que tinha quase certeza de que meu fofo já sabia que eu não estaria lá... Falei do medo de Ir, encontrar ele lá e descobrir que ele tava mesmo querendo se livrar de minha presença... Ela falou pra eu largar de ser boba, que se ele tinha dito que não ia, era porque não poderia ir mesmo... Aí repetiu aquela ladainha de que "Uma menina como você, tão decidida... Não entendo como fica tanto tempo afim de um cara sem chegar nele?"... Ela vive dizendo isso... Fala que gostava mais de mim quando eu dizia "Homem não me pega, eu que pego homem...", ou "Dou na primeira noite, sim, e daí?"... Mas a grande verdade é que eu nunca dei na primeira noite...

A minha primeira vez foi com um cara que eu não gostava, mas queria acreditar que sim... A gente namorava a três meses, e eu queria gostar dele, e me enganava, mas não gostava mesmo... Perto dele era tudo tão... Normal... E ele falava que se eu gostasse dele, eu faria amor com ele... E eu, na obcessão de confirmar que gostava dele, cedi... Mas a gente não fez amor, só trepou... Foi horrível e eu fiquei dois dias tentando me convencer de que eu tinha gostado... Não tentei convencer a ele, mas nem precisou porque ele não estava nem aí... Depois de três dias, ele me deu um pé na bunda...

Eu tentei chorar pra mostrar que estava triste com o fim do namoro... Mas não consegui, nem com as musiquinhas da Adriana Calcanhotto...

A Bia falou que não gosta de minha irmã... Eu acho que já sabia... Mas minha irmã pra ela nem fede nem cheira... A minha irmã gosta muito do Alfredo, e tenta me convencer a ficar com ele... Eles são muito amigos... Só que eu olho pro Alfredo e vejo uma réplica desse guri que me tirou a virgindade... Sem sal e insensível do mesmo jeito...

A Bia não vai com a cara da minha irmã porque ela é um pé no saco, mas ela acha que é por causa de ela ser amiga do Alfredo... Uma vez ela ouviu uma conversa nossa, e notou que a Beatriz o trata pelo singelo apelido de "Alfredo-Pau-no-Cu"... Ele é um porre mesmo...

Uma vez a Beatriz disse "Acho que esse tal de 'teu fofo' é gamado por você"... perguntei porque ela achava isso e ela disse que era intuição feminina... Esse papo de intuição feminina nunca funcionou comigo...

Mas eu optei por ir para o restaurante... E a Bia pegou o mesmo ônibus que eu... A festa que ela ia era no Centro também...

Esses momentos de ônibus são engraçados... Às vezes eu me imagino personagem de algum livro... Olho pras pernas do morenão no banco da frente e bem penso que ele podia ser meu par romântico... Algo mais romântico do que o sacolejar de um coletivo pessimamente conservado? NUNCA!

A Bia desceu antes de mim...Me deu um beijo na testa e disse que queria notícias do desafio dela... Não imaginei que ela estivesse tão interessada...

O Morenão tava de mãos dadas com uma loirinha peituda... Poxa, será que se eu fosse peituda eu conseguiria catar o meu fofo? Lembrei da Bia... "Será que ele curte gurias que dão na primeira noite?"... Pensei e ri...

Tava num clima de será... Queria tanto entrar naquele restaurante e dar de cara com ele... E dei... De cara com ele, digo... Mas não fiquei feliz, apesar de ter ficado muito feliz...

Ele me olhou, fez uma cara de "Iá, o que você tá fazendo aqui?" e riu... Pra mim...

Disse boa noite pra todos, menos pra ele... Que foi o único que não me disse que não iria naquela noite... Olhei pro Jão, que riu pra mim como se nada tivesse acontecido... Falou, poxa, que bom que você veio... Eu me senti traída pelos dois...

Mas que tola, eu... Quem eu sou?

Me perguntaram porque eu tava emburrada... Nem prestei atenção em quem foi, tava emburrada demais pra prestar atanção nisso... Só consegui dizer que não tinha nada, que é a única frase que a gente consegue elaborar quando tá de cu doce... E não olhei pra ele... Morri de vontade, mas não olhei pra ele...

Quase não comi, quase não falei... Acho que o clima ficou chato pra todo mundo... Dizem que elo falo demais... Aí o Meu fofo tirou um papel do bolso... Uns papéis... Eram uns bilhetes prum show do Hermeto... E eu adoro aquele cara... Ele disse que tinha três, e que ia convidar uma menina pra ir com ele... Aí eu levantei e fui pro banheiro...

FIquei chorando baixinho, sentada na privada... brincando com uns fiozinhos escassos de cabelo em minha coxa direita... Entendi tudo... Ele iria... O Jão iria com ele, como sempre... E aí ele ia levar outra menina... Aí eu lembrei... Um dia vi os dois falando de uma garota que eles tinham conhecido num ônibus mesmo... E que trocaram telefone... Ele falou que ela ligou no outro dia e que ficaram falando de música... E que a menina tinha namorado... Mas que queria ficar com ele assim mesmo... Mas na minha frente ele disse que nunca que ficaria com uma menina com namorado...

Acho que ele é um tremendo duas caras, isso sim... Defende a verdade que mais convém a ele...

Me doeu...

Ia saindo do baneiro e vi que ele tava em pé, e discutindo com um garçon... tinha dois bilhetes na mão, rasgados... E gritava "Você sabe o que fez, cara?"... E o garçon queria colocá-lo pra fora...

E eu fui me aproximando da mesa e o Jão olhava pra mim com cara de aflito... Não tinha cabeça pra entender nada... Sentei na mesa e ninguém prestou atenção em mim... só o Jão, que falou dos olhos vermelhos...

"Você tava chorando?", "O que aconteceu?", "Você tava chorando?", "O que aconteceu?", "Você tava chorando?", "O QUE ACONTECEU, PORRA?", e comecei a chorar como uma mocinha... Aí o Jão me abraçou e disse "Ô mocinha, o que houve?"

E o meu Ex-fofo gritava "...Intransigente! Você trata todos os clientes assim, colega?", e o garçon "Eu não sou teu colega"... "Quero outros ingressos ou a gente vai ter problemas com a casa, colega!", "O que é que você vai fazer, heim?"

Aí o Jão fez um carinho em minha nuca e disse, espera um pouquinho, tá?

Eu esperei e ele levantou e foi até o Garçon... "Eu não preciso bater na tua cara pra te mostrar que a gente não é cachorro do teu canil, né sujeito?", falou num tom de voz tranquilo... O Garçon falou algo como "Olha como fala comigo"... E ele disse que "Eu não sou teo colega e falo como eu quiser, vai me bater?"... O Garçon ficou desmotivado a gritar... Aí o Gerente veio...

"O que houve aqui?"... Aí o Garçon disse que o rapaz portava um bilhete de uma empresa lá, que ele disse o nome e que eu nunca ouvi falar... Parece que a empresa que foi contratada pra organizar o evento em que o Hermeto vai tocar é de um cara que também é proprietário de uma rede de restaurantes que é forte concorrente daquele em que estávamos... E parece que havia um regulamento sobre portar bilhetes de outros estabelecimentos ali... E parece que meu finado-fofo disse que não ia guardar porra nenhuma de bilhete... Aí a Carlinha disse, mas antes ele tentou conversar com o garçon, e o Célio contou que o Garçon ameaçou rasgar os bilhetes, e o Marcos desafiou o cabra... Aí ele pegou os bilhetes... E eles rasgaram...Aí o Marcos que era fofo gritou... E eu saí do banheiro...

Aí o Jão interrompeu o Garçon e sinalizou pro Marcos parar de gritar: "Olha, Amigo... Entendo que vocês queiram regular certas coisas que competem a vocês, mas esse bilhete deve ser reposto..."

Foi um grande engano, um incidente que será resolvido... Disse o Gerente... Aí o João Pedro disse que "O senhor sabe que tudo que isso não pode ser chamado é de 'engano'... Mas ainda assim confiamos que será resolvido...", olhou pro Garçon, e de volta pro gerente... "E tem que ser depressa"...

Às vezes o Jão acha que tá num filme ou seriado de TV... Aí fala como se fosse um super herói disfarçado de jornalista, ou um agente da CIA... Mas o jeito firme e manso que ele usa sempre surte efeito...

Aí aquela briga ridícula acabou, e o Meu Não-Fofo tentou inventar um assunto pra quebrar o clima:

"Caracas, tenho recebido umas cartas...", e falou que minhas cartas eram bizarras, e que não entendia nada, que era algum imbecíl que achava que ele tinha a obrigação de saber falar todas as línguas do mundo, e que ele não tinha paciência para aquela falta de nexo, e mais um monte de coisas que me fizeram segurar uma garrafa...

De repente tinha alguém me segurando e ele tava desmaiado no chão... Acho que acertei a garrafa na cabeça dele... E eu não lembro de mais nada... Na verdade não aconteceu nada... Ele ficou caído, uns ajudando ele, outros me atrapalhando... Nossa mesa de novo no centro do restaurante... Ele levantou e olhou pra minha cara... Falaram calma e ele perguntou se eu tava louca... Eu não sabia o que dizer... Minha pior noite... João Pedro me abraçou e pediu calma... Pediu calma pro Marcos que tava sangrando a testa... E gelo pro garçon... Outro garçon...

Marcos falou, com uma calma séria, mas linda: "Ana, o que foi isso?" Aí eu gritei que tinha escrito as cartas, e ele ficou olhando pra minha cara com cara de quem tava olhando pra cara de um cara que acabou de dizer que olhou pra cara do John Lennon ontem à noite no vestiário do parque aquático... Aí o João disse "Mas você não fala turco, Clau...", com uma cara de quem diz "Sempre preferi o Paul Mccartney...

"Turco?", Perguntei...

E o Marcos, "Porque levantou quando eu ia te entregar o bilhete?"... Aí eu consegui pensar alguma coisa... Pensei "O autor do livro da minha vida não é nem um pouco criativo..."

Aí eu tentei responder à pergunta dele... E soltei um monte de coisa... Sobre ele ter dito que não iria... Não ter ido me buscar... Sobre ter falado de minhas cartas... Até imbecíl eu virei na boca dele... Ele se aproximou... Como é? Aí o João, Como é?

Cochichou no meu ouvido que tinha avisado que ele vinha... perguntei "Quando, porra?", e ele disse, "oras, ainda perguntei se a Amanda tinha passado o recado"... E ela passou, gemi...

Então? Ao invés de responder, vc mandou recado dizendo que não sabia se vinha...

Mas eu tinha responddido, oras... Aliás, você já sabia que eu viria...

Mas e o que eu falei sobre o Mark?

Quê?

Aí o Jão conseguiu me convencer de que minha irmão é que tinha esquecido o recado... Eu, idiota, caí na hora...

Mas o Marcos veio tentar falar comigo e eu fechei a cara e pedi pra ele ficar quieto...

Aí ele disse que eu tava era fazendo por merecer o silêncio dele mesmo... Aí eu quase disse que ele não tava fazendo por merecer as aulas de francês, pra achar que aquilo era turco... Mas eu não conheço turco, né? Vai que é parecido... Celular tocou... A Bia...

"Fala Irmã" Disse "um instante" e fui pro banheiro... Ela perguntou como eu tava, eu disse que tinha acabado de rachar a cabeça do menino... E ela perguntou se eu tinha bebido... Aí eu comecei a chorar de novo... E ela disse que Tinha ganhado dois bilhetes pra ela e eu irmos no show do Hermeto Pascoal... Aí ela perguntou porque eu ri daquele jeito... Aí eu contei que tinha estragado tudo, e tentei contar como o fiz... Mas me embolei toda... Ela falou que confiava em mim, e que a noite terminaria bem... Mas ela me ajudaria mais se dissesse uma mentira menos bizarra... Nem ela mesma tava convencida disso...

Depois disso ela pediu pra eu desligar o telefone, que não queria falar comigo enquanto eu não resolvesse isso tudo... E eu fiquei com medo de sair dali... Mas a possibilidade do Rambô ser turco me abalou profundamente... Mesmo...

Voltei... Todo mundo sentado... Sentei perto dele, o Jão me cedeu o lugar... Cochichei, só o veneno, "Acabei de ser convidada pro show do Hermeto"... "Ainda tenho um bilhete, vai comigo?"... "Você não ia me chamar, ia?"...

Ele ficou parado, olhando pra mim... Disse "Eu te amo, mas não entra na minha cabeça que alguém consegue ser tão burra como você... A gente se esforça por..."

Aí eu bati na mesa e um copo de cerveja saltou longe, despejando um bocado nele...

Não preciso de CD's da Adriana Calcanhoto pra chorar agora...


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